sexta-feira, 14 de agosto de 2009

A Grande Holarquia do Ser - Ken Wilber

Como já disse, todas as grandes tradições mundiais são basicamente variações da filosofia perene, da Grande Holarquia do Ser. Em seu maravilhoso livro Forgotten Truth, Huston Smith resumiu as maiores religiões do mundo em uma sentença: “A hierarquia do ser e do conhecer.” Chõgyam Trungpa Rinpoche salientou, em Shambhala: The Sacred Path of the Warrior, que a idéia mais essencial e abrangente, que permeia todas as filosofias do Oriente, da Índia até o Tibete e a China, e que está por trás de tudo, do xintoísmo ao taoísmo, é a “hierarquia terra, ser humano, céu”, que ele também aponta como equivalente a “corpo, mente, espírito”. E Coomaraswamy afirmou que as grandes religiões do mundo, sem exceção, “em graus diferentes, representam a hierarquia de tipos ou níveis da consciência, es­tendendo-se desde o animal até a divindade, e de acordo com a qual o mesmo indivíduo pode funcionar em ocasiões diversas”.

O que nos leva ao maior paradoxo da filosofia perene. Já vimos que as tradi­ções de sabedoria participam da noção de que a realidade se manifesta em níveis ou dimensões, com cada dimensão mais elevada sendo mais inclusiva e, portanto, mais “próxima” da totalidade absoluta da Divindade, ou Espírito. Nesse sentido, o Espírito é o cume do ser, o degrau mais alto da escada da evolução. Mas também é verdade que o Espírito é a madeira da qual toda a escada e todos os degraus são feitos. O Espírito é o sujeito, o ser, a essência de tudo o que existe.

O primeiro aspecto, o aspecto superior, é a natureza transcendental do Espírito — ela sobrepassa de longe qualquer coisa “mundana”, ou criatural, ou finita. A terra inteira (ou mesmo o universo) poderia ser destruído, e o Espírito permanece­ria. O segundo aspecto, o aspecto madeira, é a natureza imanente do Espírito — o Espírito está igual e totalmente presente em todas as coisas e acontecimentos ma­nifestos, na natureza, na cultura, no céu e na terra, sem parcialidade. Deste ângu­lo, nenhum fenômeno está mais perto do Espírito do que outro, pois todos são igualmente “feitos” de Espírito. Deste modo, o Espírito é ambos, tanto a meta de todo desenvolvimento e evolução, quanto o fundamento da seqüência inteira, tão presente no início quanto no fim. O Espírito é anterior a este mundo, mas não outro em relação a este mundo.

Não levar esses paradoxos em consideração resultou, na História, em algumas visões bem distorcidas (e politicamente perigosas) do Espírito. Tradicionalmente, as religiões patriarcais tenderam a super enfatizar a natureza transcendental do Espírito, condenando assim terra, natureza, corpo e mulher a um status inferior. Antes disso, as religiões matriarcais tinham a tendência de enfatizar apenas a na­tureza imanente do Espírito, e as visões de mundo panteístas resultantes iguala­ram a Terra finita e criada ao Espírito infinito e incriado. Você é livre para se identificar com uma Terra finita e limitada; você não é livre para chamá-la de infinita e ilimitada.

Tanto a religião patriarcal quanto a matriarcal, ambas visões distorcidas do Espírito, tiveram conseqüências históricas bem terríveis, desde sacrifícios huma­nos brutais em larga escala, em homenagem à fertilidade da Deusa da terra, até a guerra total pelo Deus Pai. Mas, em meio a essas distorções exteriores, a filosofia perene (o âmago esotérico ou interior das religiões da sabedoria) sempre evitou a dualidade — Céu ou Terra, masculino ou feminino, infinito ou finito, ascético ou celebratório — e se concentrou, em vez disso, na união desses elementos, ou na sua integração (não-dualismo). E, na verdade, essa união entre Céu e Terra, mas­culino e feminino, infinito e finito, ascensão e queda, sabedoria e compaixão fica explícita nos ensinamentos “tântricos” de diversas tradições de sabedoria, desde o neoplatonismo, no Ocidente, até o vajrayana, no Oriente. E é a esse âmago não dualista das tradições de sabedoria que o termo “filosofia perene” mais se aplica.

A questão, assim, é que, se vamos tentar pensar no Espírito em termos men­tais (o que implica necessariamente algumas dificuldades), então pelo menos deveríamos nos lembrar desse paradoxo transcendente/imanente. Paradoxo é sim­plesmente a maneira como a não-dualidade aparece no nível mental. O Espírito em si não é paradoxal; estritamente falando, ele não é caracterizável, de modo algum.

Isso se aplica duplamente na hierarquia (holarquia). Afirmamos que, quando o Espírito transcendental se manifesta, ele o faz em estágios, ou níveis — a Grande Holarquia do Ser. Mas não estou querendo dizer que o Espírito em si, ou a realida­de, é hierárquico. O Espírito absoluto, ou a realidade, não é hierárquico. Ele não é de modo algum qualificável em termos mentais (em termos de hólons inferiores) — é shunyata, ou nirguna, ou apofático —, é inqualificável, sem um único traço de características específicas e limitantes. Mas manifesta-se em degraus, em cama­das, dimensões, invólucros, níveis ou graus — o termo que se preferir — e isso é holarquia. No vedanta, são os koshas, os invólucros ou camadas que cobrem Brahma; no budismo, são as oito vijnanas, os oito níveis da percepção, cada um dos quais sendo um degrau abaixo ou uma versão mais restrita da dimensão acima; na Caba­la são as sefirot, e assim por diante.

A questão toda é que esses são níveis do mundo manifesto, de maya. Quando maya não é reconhecida como um ato do Divino, ela não passa de ilusão. Hierar­quia é ilusão. Há níveis de ilusão, não de realidade. Mas de acordo com as tradições, é exatamente (e somente) compreendendo a natureza hierárquica do samsara que podemos, na verdade, sair dele, subindo por uma escada que só poderá ser descartada depois de servir a seu extraordinário propósito.

Podemos examinar agora alguns dos verdadeiros níveis ou esferas da holarquia, do Grande Ninho do Ser, como aparecem nas três maiores tradições de sabedoria: judeu-cristã-muçulmana, budismo e hinduísmo, ainda que pudéssemos usar qual­quer tradição madura.

(Não se esqueça de que esses níveis são do quadrante Superior Esquerdo, os níveis do espectro da consciência em si. Nos capítulos que seguem, veremos como esse espectro se comporta também nos outros quadrantes, o cultural, o social e o comportamental — da antropologia à filosofia, à arte e à literatura. Mas, por ago­ra, vamos nos concentrar no espectro da consciência como aparece no ser huma­no individual, o quadrante Superior Esquerdo.)

Os termos cristãos são os mais fáceis, porque a maioria de nós já os conhece: matéria, corpo, mente, alma, espírito. Matéria significa o universo físico, como aparece em nossos próprios corpos físicos (isto é, aqueles aspectos de nossa exis­tência cobertos pelas leis da física); e tudo o mais que queremos dizer com a pala­vra “matéria” significa, neste caso, a dimensão com a menor quantidade de cons­ciência (alguns diriam sem consciência; a escolha é sua). Corpo, neste caso, signi­fica o corpo emocional, o corpo “animal”, sexo, fome, energia vital e assim por diante (isto é, os aspectos da existência estudados pela biologia). Mente é a mente racional, racionalizante, lingüística e imaginativa (estudada pela psicologia). Alma é a mente mais elevada ou sutil, a mente arquetípica, a mente intuitiva, e a essên­cia ou indestrutibilidade de nosso ser (estudada pela teologia). E Espírito é o topo transcendental do nosso ser, a nossa Divindade (estudada pelo misticismo contemplativo).

De acordo com o hinduísmo vedanta, cada pessoa é composta de cinco “invó­lucros”, ou níveis, ou esferas do ser (os koshas), muitas vezes comparados com uma cebola, de modo que, à medida em que tiramos as camadas externas, encontramos cada vez mais a essência. A mais baixa (ou mais exterior) é chamada de annamaya­kosha, que significa “o invólucro feito de alimento”. Essa é a esfera física. A seguir vem a pranamayakosha, o invólucro feito de prana. Prana significa força vital, bioenergia, élan vital, libido, energia emocional-sexual em geral — a esfera do corpo emocional (termo que preferimos usar), A seguir é o manomayakosha, os invólucros de manas, ou mente — racional, abstrata, lingüística. Para além desta, está o vijnamayakosha, o invólucro da intuição, a mente superior, a mente sutil. Finalmente, temos o anandamayakosha, o invólucro feito de ananda, ou o êxtase espiritual e transcendental.

Ademais — e isto é importante — o vedanta agrupa esses quatro invólucros em três setores mais importantes: bruto, sutil e causal. O setor bruto está correlacionado com o nível mais baixo na holarquia, o corpo físico (annamayakosha). O setor sutil está correlacionado com os três níveis intermediários: o corpo emo­cional-sexual (pranamayakosha), a mente (manomayakosha) e a mente mais eleva­da ou sutil (vjnanamayakosha). E o causal está correlacionado com o nível mais ele­vado, o anandamayakosha, ou espírito arquetípico, que é considerado, algumas vezes, não-manifesto, ou sem forma. Além disso, o vedanta relaciona esses três setores maiores do ser com os três maiores estados da consciência: a vigília, o sonho e o sono profundo sem sonhos. Para além de todos esses três estados, está o Espírito absolu­to, algumas vezes chamado turiya, “o quarto’, porque está além dos três estados de manifestação (e os inclui); está além do bruto, do sutil e do causal (e assim os integra).1

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(1) O sistema Vedanta (e seu primo distante, o Vajrayana) contém um raro modelo geral das estruturas e dos estados da consciência, o que explicarei mais tecnicamente da seguinte maneira;

Os cinco invólucros são invólucros da consciência, ou mente, em seu sentido mais amplo — consciência física, consciência emocional, consciência conceptual, consciência intuitiva, consciência espiritual. E a isso que me refiro como estruturas básicas da cons­ciência, as dimensões e níveis do Lado Esquerdo (superior) da psique humana.

Mas o Vedanta percebeu que não existe corpo sem mente, nem consciência sem supor­te. Desse modo, cada mente é suportada por um corpo — o corpo grosseiro (suportando a mente inferior), o corpo sutil (sustentando as três mentes “intermediárias”), e o corpo causal (suportando a mente superior, ou não-manifesta). Esses corpos são apenas o supor­te material para o processo “consciente” — em outras palavras, eles representam as dimensões do Lado Direito da psique humana. (No Vajrayana, e no Tantra em geral, as três mentes estão suportadas por três “ventos”, ou correntes de energia, também referidas como grosseira, sutil e verdadeiramente sutil.)

Assim, podemos representar precisamente o ponto de vista do Vedanta/Vajrayana fa­lando do corpo-mente grosseiro, do corpo-mente sutil e do corpo-mente causal, cobrindo o espectro tanto no domínio do Lado Esquerdo quanto no do Lado Direito, com uma importante condição: Deus está sempre dos dois lados (isto é, esses domínios são inseparáveis, a mente grosseira sempre ocorre junto com o corpo grosseiro, a mente sutil como corpo sutil, e assim por diante).

Além disso, de acordo com o Vedanta/Vajrayana, essas estruturas básicas — os níveis do corpo-mente, grosseiro, sutil e causal, que são invólucros permanentes, ou níveis à disposição dos seres humanos — têm correlação com os estados temporários da consciên­cia (não estruturas permanentes, mas estados temporários), do seguinte modo: vivencia-se o corpo-mente grosseiro principalmente no estado de vigília, o corpo-mente sutil no estado de sonho, e o corpo-mente causal no estado de sono profundo sem sonhos (o não-manifesto). O que interessa aqui é que essas estruturas e estados não são simplesmente a mesma coisa (a falta de compreensão dessa distinção elementar tem prejudicado muitas teorias transpessoais).

Em diversos estados meditativos, os níveis superiores do corpo-mente são levados à percepção, primeiro como estados temporários, e depois, com o tempo, como estruturas permanentes. O resultado final dessa conversão de estados em características é moksha ou liberação radical — uma liberdade radical de toda manifestação, como toda manifestação. Em outras palavras, o reconhecimento radical daquele Espírito que é tanto a meta quanto o fundamento de todos os estados e de todas as estruturas (turyia, a “quarta”, depois do corpo-mente grosseiro, sutil e causal — em outras palavras, o Vazio, ou Taleza, da demonstração inteira, que não é uma mudança de estado, mas a condição sem estado de todos os estados).

Esse é um modelo extraordinário da consciência humana, o mais abrangente de todas as tradições (incorporando estruturas, estados e níveis tanto do corpo/Direito quanto da mente/Esquerdo). O que lhe falta, na minha opinião, são os detalhes de desenvolvimento (uma abordagem especializada nesse aspecto, feita pelo Ocidente moderno). Com uma sensibilidade mais ocidental de desenvolvimento, podemos adicionar uma compreensão das estruturas transitórias associadas com cada uma dessas estruturas básicas. O resultado dessa síntese seria um apanhado geral genuinamente Ocidente/Oriente, Apresento um modelo assim do capítulo 6 ao 10, e debato a razão por que essas adições são necessárias para preencher o modelo Vedanta/Vajrayana.

Finalmente, o que falta no modelo Vedanta/Vajrayana — na verdade, o que está em geral faltando na filosofia perene — é uma compreensão de como o Inferior Esquerdo (cultural) e o Inferior Direito (social) influenciam de um modo profundo, e muitas vezes governam, a consciência e o comportamento individuais que eles, de outro modo, com­preendem tão bem. A Grande Corrente, por exemplo, parece diferente — está diferente — nos mundos mítico, mágico e mental. Isso é mais uma maneira de dizer que os estudos integrais devem ser não apenas “todos os níveis”, mas “todos os níveis, todos os quadrantes”. Os estudos de Gebser (I.E) e Marx (I.D.), por exemplo, não fazem sentido nenhum para um teórico da Grande Corrente, e, na verdade, nem têm lugar na visão tradicional, uma visão que, apenas nisso, é bastante inadequada.

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A versão vedanta dos cinco invólucros, por sua vez, é quase idêntica à versão judeu-cristã-muçulmana de matéria, corpo, mente, alma e espírito, desde que en­tendamos “alma” não apenas como um eu mais elevado, ou uma identidade mais elevada, mas como uma mente e uma cognição mais elevadas e mais sutis. E alma também significa, em todas as tradições místicas superiores, um “nó”, ou “contra­ção” (o que os hindus e budistas chamam de ahamkara), que precisa ser desatado e dissolvido antes que a alma possa transcender a si mesma, morrer para si mesma, e assim encontrar uma identidade suprema com, e como, o Espírito absoluto (como disse Cristo: “Quem não odeia a própria vida não pode ser meu discípulo.”).

“Alma”, então, é tanto o nível mais elevado que podemos atingir no cresci­mento individual quanto a barreira final, o nó final, para completar a iluminação ou suprema identidade, pela simples razão de que, como observador transcendental, fica fora de tudo o que observa. Uma vez que atingimos a posição de observador, a própria alma ou observador se dissolve, e permanece apenas o ato de percepção não-dualista, percepção que não olha para os objetos, mas é completamente una com todos os objetos (o zen diz: “É como provar o céu.”). A brecha entre sujeito e objeto vem abaixo, e a alma transcende a si mesma ou se dissolve, e surge a pura percepção não-dualista ou espiritual — que é bem simples, bem óbvia, bem clara. Você se dá conta de que seu ser intrínseco é vasto e aberto, vazio e claro, e que tudo o que surge em qualquer lugar surge dentro de você, como espírito intrínseco, espontaneamente.

O modelo psicológico central do budismo mahayana são as oito vijnanas, os oito níveis da consciência. Os primeiros cinco são os cinco sentidos. O próximo é o manovijnana, a mente que opera na experiência sensorial. Depois vem o manas, que significa tanto a mente mais elevada quanto o centro da ilusão do eu separa­do. E o manas que olha para o alayavijnana e o confunde com um eu separado, ou alma substancial, segundo a nossa definição. E, além desses oito níveis, tanto como fonte quanto como fundamento, está a pura alaya, ou puro Espírito vazio.

Não estou querendo minimizar algumas das diferenças bastante reais entre essas tradições. Estou apenas salientando que elas compartilham algumas seme­lhanças estruturais profundas, que atestam, cora eloqüência, a natureza genuina­mente universal de muitas de suas percepções.

E assim podemos ter um final feliz: depois de ter descarrilhado temporariamen­te, durante o século XIX, devido a diversos reducionismos materialistas (do materialismo científico ao behaviorismo e ao positivismo), a Grande Corrente do Ser, a Grande Holarquia do Ser, está fazendo uma reestréia extraordinária. Aquele descarrilamento temporário — tentativa de reduzir a holarquia do ser ao seu nível mais baixo, a matéria — foi particularmente irritante na psicologia, que primeiro perdeu o espírito, depois perdeu a alma, depois a mente, e ficou reduzida apenas ao estudo do comportamento empírico, ou dos impulsos corporais, uma restrição que, em qualquer outra época ou lugar, seria uma definição precisa de insanidade.

Mas agora a holarquia evolutiva — o estudo holístico do desenvolvimento e da auto-organização de campos dentro de campos dentro de campos — é, mais uma vez, um tema dominante em muitas disciplinas científicas e comportamentais (como veremos), ainda que seja chamada por muitos nomes (a “enteléquia” de Aristóteles, para dar pelo menos um exemplo, é agora conhecida como “campos morfogenéticos” e “sistemas auto-organizados”). Isso não quer dizer que as ver­sões modernas da Grande Holarquia não ofereçam novas idéias, porque elas ofere­cem, particularmente quando se trata do desenvolvimento evolutivo da própria Grande Corrente. Cada vislumbre da Grande Holarquia é adequado; cada vislum­bre que avance um passo à frente é mais adequado...

Mas os aspectos essenciais são inequívocos. Ludwig von Bertalanffy, o funda­dor da Teoria Geral de Sistemas, resumiu perfeitamente: “A realidade, na concep­ção moderna, aparece como uma tremenda ordem hierárquica de entidades orga­nizadas, levando, numa superposição de muitos níveis, do sistema físico e químico ao sistema biológico e sociológico. Essa estrutura e combinação hierárquica em sistemas de ordens cada vez mais elevadas é característica da realidade como um todo, e de importância fundamental, especialmente na biologia, na psicologia e na sociologia.”

Assim, por exemplo, na psicologia moderna, a holarquia é o paradigma estrutural e de processo dominante, atravessando o verdadeiro (e muitas vezes bem dife­rente) conteúdo das diversas escolas. Cada escola de psicologia do desenvolvi­mento reconhece alguma versão de hierarquia, ou uma série de discretos (mas contínuos) estágios irreversíveis de crescimento e desenvolvimento. Isso inclui os freudianos, os junguianos, os piagetianos, Lawrence Kohlberg, Carol Gilligan, e o behaviorismo cognitivo. Maslow, representando tanto a psicologia humanista quan­to a transpessoal, colocou a “hierarquia das necessidades” no centro do seu siste­ma — só para mencionar alguns.

De Rupert Sheldrake e da sua “hierarquia de campos morfogenéticos aninha­dos” à “hierarquia das qualidades emergentes”, de Karl Popper, e ao “modelo eco­lógico da realidade”, de Birch e Cobb, baseado no “valor hierárquico”; do trabalho que preparou as bases dos sistemas auto-poiéticos, de Francisco Varela (“parece ser uma reflexão geral das riquezas dos sistemas naturais produzir uma hierarquia de níveis”), à pesquisa do cérebro de Roger Sperry, de sir John Eccles e de Wilder Penfield (“uma hierarquia de emergentes não-redutíveis”) e à teoria da crítica social de Jürgen Habermas (“uma hierarquia de capacidade comunicativa”) — a Grande Corrente está de volta.

E a única razão pela qual ninguém percebe isso é porque ela se esconde sob diversos nomes diferentes.

Mas não importa; percebida ou não, ela já está a caminho. E a melhor coisa a respeito desse retorno é que agora a teoria moderna pode fazer uma religação com suas ricas raízes da filosofia perene, não apenas com Platão, Aristóteles, Plotino, Maimônides, Hegel e Teresa no Ocidente, mas também com Shankara, Padmasam­bhava, Chih-i, Fa-tsang, Abinavagupta e lady Tsogyal, no Oriente — tudo isso tornando-se possível devido ao fato de que muitos aspectos da filosofia perene realmente parecem perenes — ou essencialmente universais, onde quer que apa­reçam — cruzando assim tanto épocas quanto culturas, apontando direto ao cora­ção, à alma e ao espírito da família humana (na verdade, todos os seres sencientes como tal).

Na realidade, só há uma coisa a fazer, um item fundamental na agenda do retorno. Ainda que seja verdade que a holarquia evolutiva, como mencionei, é um dos paradigmas unificantes do pensamento moderno, da física à biologia, à psico­logia e à sociologia (ver, por exemplo, Laszlo, Jantsch, Habermas, Lenski, Dennett), mesmo assim, a maioria das escolas ortodoxas de inquirição admite apenas a existência da matéria, do corpo e da mente.2 As dimensões mais elevadas da alma e do espírito ainda não atingiram essa posição. Pode-se dizer que o Ocidente moderno só reconhece três quintos da Grande Holarquia do Ser. A ordem do dia, então, é reintroduzir os outros dois quintos (a alma e o espírito).

Uma vez que reconheçamos e respeitemos todos os níveis e dimensões da Grande Corrente, reconheceremos, simultaneamente, todas as modalidades corresponden­tes de conhecimento — não apenas o olho da carne, que desvenda o mundo físico e sensorial, nem só o olho da mente, que desvenda o mundo lingüístico e simbóli­co, mas também o olho da contemplação, que desvenda a alma e o espírito. (Retornaremos a esse importante tópico no Capítulo 3.)

A ordem do dia, então, é a seguinte: vamos dar o último passo, e reintroduzir o olho da contemplação, que, como método científico e repetível, desvenda alma e espírito. E essa visão integral é, eu afirmo, o retomo final, o reentrelaçamento de nossa alma moderna com a alma da própria humanidade — o verdadeiro significa­do do multiculturalismo — de modo que, levantados em ombros de gigantes, pos­samos transcender mas incluir, o que sempre significa respeitar, sua presença re­corrente. Assim, a unificação da sabedoria antiga com o conhecimento moderno é o toque da trombeta da visão integral, um farol no deserto pós-moderno.

FONTE: Excerto do Capítulo I (O Espectro da Consciência) do livro “O Olho do Espírito”, de Ken Wilber, filósofo norte-americano criador da Filosofia Integral, publicado no Brasil pela Editora Cultrix, em 2001. Neste livro, o autor busca através de uma abordagem integrativa tecer os vários fragmentos do conhecimento humano numa coerente e inspiradora visão de mundo .

Uma Introdução à Visão de Mundo de Leadbeater - Shirley Nicholson

No clima atual de interesse pelo Ocultismo, nova onda de atenção está sendo dirigida a investigadores clarividentes, como C. W. Leadbeater. Esses videntes bem dotados oferecem uma visão ampliada do homem e do universo que abrange áreas inteiras incognoscíveis, quando tomadas através de meios físicos de investigação. As perspectivas que expõem podem fornecer pistas para a compreensão de fenômenos de interesse atual, aliás inexplicáveis, como eventos parapsicológicos, prognosticação, cura, etc.

Quanto à autenticidade das faculdades clarividentes, o próprio Leadbeater percebeu, já em sua época, que "existe uma massa avassaladora de provas irrefutáveis da existência dessa faculdade". As provas do século XX são mais convincentes ainda.

Parapsicólogos coligem e acompanham casos espontâneos, assim como a conduta controlada por estudos de laboratório. Médicos consultam médiuns em casos difíceis de diagnosticar. Até a polícia se fia, por vezes, de médiuns para solucionar crimes intricados. Mas a prova mais convincente vem da estreita correspondência entre as narrativas relacionadas com mundos invisíveis, fornecidas por médiuns e clarividentes tanto nos tempos antigos quanto nos modernos. Dir-se-á que eles respondem à mesma realidade supersensorial, se bem que, necessariamente, com sua interpretação individual. Como diz Leadbeater:

“o clarividente é simplesmente um homem que desenvolve, dentro de si mesmo, o poder de responder em outra oitava fora da escala estupenda de vibrações possíveis, e assim permite a si mesmo ver mais do mundo que o cerca do que os de percepção mais limitada.”(1)

As palestras que compõem este livro, A VIDA INTERIOR, foram proferidas para estudantes de Leadbeater e Annie Besant, sua íntima colaboradora, e clarividente como ele. Leadbeater presumia que o seu público estivesse inteiramente familiarizado com a sua visão ampliada do mundo. Na presente edição parece-nos necessário esboçar algumas das principais características dessa visão, a fim de tornar o livro mais compreensível.

A visão ampliada do mundo não surgiu com Leadbeater, embora tenha preenchido muitos pormenores deixados anteriormente em branco. O seu esquema ajusta-se a uma tradição venerável, que acompanha a humanidade desde tempos pré-históricos.

A História mostra um núcleo de verdade que transparece através dos séculos, às vezes ensinada abertamente, dominando uma cultura, como na Grécia antiga, outras vezes ensinada às ocultas e somente aos que a procuravam. Os princípios receberam denominações diferentes e vários aspectos foram enfatizados em épocas diversas, mas o que neles havia de fundamental permaneceu inalterado pelos séculos afora. O núcleo de compreensão é variadamente conhecido hoje como sabedoria antiga, filosofia oculta, tradição esotérica, teosofia. Chama-se "oculta" porque versa o que está escondido, o que não é óbvio. Versa os processos e leis da natureza, o que se situa atrás e além da ciência, e supõe o estudo dos princípios metafísicos que sustentam o universo.

Podem encontrar-se traços dessa filosofia em várias fontes, como a Grécia antiga, Platão, Pitágoras, a Cabala, Zohar, o Gnosticismo Cristão, Lao- Tsé, as tradições hindu e budista, o Sufismo, para mencionarmos apenas algumas. O fio de verdade que corre através desses ensinamentos foi identificado por H. P. Blavatsky em sua obra notável sobre filosofia oculta, A Doutrina Secreta. Leadbeater conduziu suas investigações no contexto da visão do mundo antigo, tal como foi desenvolvida nos mesmos ensinamentos desta.

Esta filosofia repousa sobre a premissa de que existe um princípio de substância imutável, homogênea, divina, do qual nasce o mundo. O mundo físico visível emerge, gradativamente, da sua fonte divina não-material. Essa idéia é altamente plausível no cenário da física moderna. A teoria da Relatividade de Einstein concebe o tempo e o espaço não como dados distintos e separados, mas como dados inseparáveis e interdependentes. A física nuclear - a ciência das partículas subatômicas - estriba-se na noção de campos elétricos e magnéticos inteiramente não-materiais. Falando de campos de quantum, ou campos que podem assumir a forma de quanta ou partículas, Fritjof Capra diz em O Tao da Física:

“O campo de quantum é visto como a entidade física fundamental; um meio contínuo presente em toda a parte do espaço. As partículas são simples condensações locais do campo; concentrações de energia que vão e vêm, perdendo, por essa razão, o caráter individual e dissolvendo-se no campo subjacente.” (2)

Esses campos e essa matéria não-materiais são vistos como uma coisa só; o material emerge das suas origens não-materiais e nelas desaparece.

De acordo, porém, com a filosofia oculta, o mundo físico é apenas uma pequena parte do espectro total da matéria. É o mais denso, o mais concreto de uma série de mundos que vão do "superfísico", extremamente tênue, ao físico sólido. Esta idéia encontra-se nos mistérios egípcios antigos, no Hinduísmo e no Budismo, e tem paralelos na noção grega dos Elementos. Muitos clarividentes como Leadbeater, sensíveis a uma série enorme de estímulos, têm dado importante testemunho corroborativo da existência desses mundos mais finos.

A idéia não é tão forçada numa época em que nossos aparelhos de televisão e nossos rádios, por exemplo, dão constante testemunho da existência de ondas supersensoriais que se precipitam à nossa volta. Instrumentos têm revelado a luz invisível, como a ultravioleta, sons inaudíveis além do alcance do ouvido humano, raios X, raios cósmicos, microondas e muito mais. Sabemos que o espaço à nossa volta está carregado de uma variedade de energias que não podemos detectar com os sentidos.

Sustenta a filosofia oculta que existem diversos níveis de material supersensório, estruturados de maneira significativa, ordenadamente. De acordo com o modo com que Leadbeater apresenta esse conceito, o mundo físico familiar tríplice de sólidos, líquidos e gasosos estende-se para quatro estados mais raros de matéria, coletivamente denominados plano ou nível etérico. Essa matéria sutil interpenetra os objetos físicos, incluindo os corpos de coisas vivas, nos quais o seu papel está estreitamente ligado à vitalidade e à saúde.

Interpenetrando os mundos físico e etérico, há uma esfera radiante, sempre em

movimento, denominada plano ou mundo astral. Escrevendo na primeira década do século XX, diz Leadbeater:

“... em algumas experiências, os nossos homens de ciência hão de estar, na realidade, desintegrando a matéria física, e atirando-a de volta ao plano astral; tudo indica que, nesse caso, eles devem sentir-se, neste momento, forçados a admitir a existência da matéria astral, embora, naturalmente, não pensem nela senão como nova subdivisão da matéria física.” (3)

Os átomos, hoje, são subdivididos de maneira que ninguém sonhava no tempo de Leadbeater. O pronunciamento dele dá a entender que talvez as numerosas partículas, de vida curta, que aparecem nas câmaras de nuvem da física moderna emergem do plano astral.

O homem tem uma aura ou campo de energia no nível astral (a que Leadbeater

chamou corpo astral) que veicula a emoção e os desejos. Assim como a vida – ou energia vital - caracteriza o etérico, da mesma forma o sentimento ou emoção é o fenômeno de campo que ocorre no nível astral. O astral interpenetra o corpo físico e interage com ele por meio do etérico, ou vital, de sorte que as emoções e o corpo trabalham em íntima conexão. O nível mais fino seguinte, o da mente concreta, também está estreitamente ligado ao nível astral, tanto na aura da pessoa como no plano da natureza que lhe é característico, denominado plano mental inferior ou manásico.

Os centros turbilhonantes de energia chamados chacras, existentes em todos os níveis, ajudam a integrar as forças desses planos. Os chacras são centros de consciência, assim como focos de energia, e, dessa maneira, se acham também ligados ao despertar espiritual.

Os níveis superiores do plano mental estão associados ao pensamento filosófico abstrato, mais profundo. Leadbeater refere-se a ele chamando-lhe nível mental superior ou manásico. Além dele existe um nível cognominado búdico em muitos escritos teosóficos, os reinos da introvisão intuitiva, o mais tênue dos quais é a fonte do próprio sentimento do eu no homem, a essência espiritual humana em sua personificação mais pura.

Cada um desses níveis existe como um estado único de matéria rarefeita em toda a natureza, bem como em veículos individuais do homem, organizados com a matéria daquele plano. Leadbeater chama à matéria dos planos astral e mental "essência elemental". De acordo com a sua exposição cada um dos planos se subdivide em sete subplanos, que vão desde o mais sutil até o mais denso. Tais níveis de existência estão documentados na filosofia hindu e no Budismo, onde os veículos do homem em níveis diferentes se denominam koshas, ou invólucros. O Lama Anagarika Govinda, autoridade contemporânea em Budismo tibetano, dá relevo à interpenetração dos diferentes planos.

Esses invólucros, portanto, não são camadas separadas, as quais, uma depois da outra, se cristalizam em torno de um núcleo sólido, senão formas de energia que se penetram mutuamente, desde a mais fina consciência luminosa, "onirradiante", onipenetrante, até a forma mais densa de "consciência materializada", que aparece diante de nós como o nosso corpo físico, visível. Os invólucros correspondentes mais finos ou sutis penetram e, desse modo, contêm os mais grosseiros.(4)

Cada nível tem sua característica única e, como as notas de um acorde, são todas necessárias à expressão plena. Arthur Osborn em The Expansion of Awareness qualifica os planos de:

“... outros modos de energia, organizados em esferas vibratórias a fim de permitir à consciência que funcione de maneiras definidas e limitadas.” (5)

Entretanto, por trás dos diversos modos e veículos, o homem permanece um ser unitário, singular. Consoante Rayno Johnson:

“Visto assim nos contornos mais amplos, podemos ver no homem uma síntese de princípios ou veículos de significação cada vez maior e de poderes mais e mais amplos, à proporção que nos acercamos da sua essência, idêntica à realidade final.” (6)

Segundo o Ocultismo, o ser interior do homem tem três aspectos, análogos à divisão em espírito, alma e corpo, feita pelo apóstolo Paulo. Essencialmente, o homem é um ponto de consciência no solo divino do qual emerge. Essa Realidade Una permanece para sempre uma unidade indivisa. Não obstante, dela emanam raios que criam o atma imortal e indestrutível, como é cognominado em sânscrito. Destinado a envolver-se com a matéria cada vez mais densa, esse raio logra uma qualidade definida nos mundos de expressão material e, envolto numa película de matéria mais rara, converte-se na mônada. Envolvendo-se, em seguida, em material proveniente do reino mental, transforma-se no que Leadbeater denomina o Ego. O seu uso da palavra difere de todo e qualquer emprego moderno. Ele quer dizer Atma-Budi-Manas, a tríade espiritual ou alma do homem, com uma localização estável no plano mental superior. Essa é a entidade reencarnante que ostenta seus poderes gerando personalidades, sem cessar, nas várias culturas do homem.

De acordo com a filosofia oculta, toda a natureza - incluindo o homem ­ evolve de acordo com um plano grandioso. Os antigos gregos sustentavam a idéia da teleologia, fim intencionado que controla o curso dos acontecimentos. Até há pouco tempo essa noção era posta de lado, em virtude, principalmente, das interpretações da teoria de Darwin da variação casual e da sobrevivência do mais apto. Hoje em dia, porém, muitos biólogos estão achando a teoria inadequada para explicar a evolução, que não conseguem conciliar com o acaso cego. Sir Alister Hardy e L. L. Whyte, entre outros, sugerem que fatores no interior do organismo - e a própria vida - desempenham papel importante no conduzir a evolução. A direção no sentido de um alvo e a tensão feita são óbvias em todo o universo da vida. De acordo com Arthur Koestler:

“A parte desempenhada pelo acaso feliz reduz-se à de um gatilho que dispara a ação coordenada de um sistema; e sustentar que a evolução é produto do acaso cego significa confundir a ação simples do gatilho, governado pelas leis da estatística, com o complexo propósito intencional que o acionou.

Qualquer processo diretivo... supõe uma referência ao futuro. A finalidade igual do processo de desenvolvimento, a luta da blástula para crescer e transformar-se em embrião, sem tomar em consideração os obstáculos e azares a que está exposta, podem conduzir o observador sem preconceitos à conclusão de que a atração do futuro é tão real quanto a pressão do passado e, às vezes, mais importante do que esta.” (7)

E. Lester Smith e outros sugeriram que uma espécie de matriz ou campo de força não-material dirige o crescimento, o desenvolvimento e a evolução. Teilhard de Chardin, o jesuíta paleontologista, apresentou argumentos convincentes, segundo os quais o propósito da evolução é dar destaque à consciência expressando-a em formas cada vez mais requintadas, o que está de acordo com a filosofia oculta.

Nos tempos modernos, as mudanças evolutivas do corpo do homem são insignificantes.

Julian Huxley foi o primeiro a sugerir que o impulso evolutivo não é físico, mas psicossocial. O homem é o agente primário da evolução à medida que transmite suas realizações e sua cultura por intermédio da linguagem. Consoante a tradição oculta, a capacidade do homem de exprimir suas potencialidades mais altas, que residem em níveis espirituais mais sutis, mais espirituais, ainda está evoluindo.

Esse desdobrar-se é proceder de acordo com um esquema de evolução a longo

prazo, esboçado por Madame Blavatsky. O Homem está destinado a evolver através de sete grandes fases, denominadas raças-raízes, expressão que não coincide com a acepção atual da palavra raça. No sentido oculto, raça é mais uma qualidade de consciência do que um tipo físico. Até o momento presente, apareceram as primeiras cinco fases de consciência, ou "raças-raízes". O plano de sete raças-raízes repete-se sete vezes em grandes círculos chamados rondas, alguns dos quais ocorreram no passado distante em planos superfísicos. Estamos agora na quarta ronda. Conforme o ponto de vista do Ocultismo, a humanidade é muito mais velha do que dão a entender os dados antropológicos.

A humanidade, como um todo, está na quinta raça-raiz, que começou a desenvolver-se em tempos pré-históricos na Índia, de acordo com Madame Blavatsky. Cada raça-raiz põe em relevo uma qualidade particular associada a um dos corpos do homem.

A quinta raça-raiz enfatiza o desenvolvimento da mente racional, concreta. As

raças-raízes subdividem-se em sub-raças, cada qual com sua própria ênfase secundária da qualidade. Atualmente, a quinta sub-raça domina na América e na Europa ocidental, provocando uma ênfase na mente racional. Daí o desenvolvimento fenomenal da ciência e da tecnologia no Ocidente. A sexta sub-raça, que agora começa a desenvolver-se, trará a intuição e a introvisão unitiva. Prenúncios disto encontram-se em alguns pensadores mais eminentes.

É impossível identificar a sub-raça a que pertencem indivíduos de determinado grupo étnico. Como assinalam antropologistas, as diferenças no interior do grupo são, muitas vezes, maiores do que as diferenças entre os grupos. As qualidades de cada raça e de cada sub-raça são necessárias e de igual valor, de modo que não podemos dizer que os tipos anteriores sejam "inferiores" aos subseqüentes. A visão ocultista da evolução não se baseia tão-só na progressão linear, senão na expansão da consciência em profundidade, em que poderes latentes são atualizados e trazidos ao controle consciente pelo indivíduo.

A filosofia ocultista sustenta que o homem ou a mulher, como ego ou alma, reencarna muitas vezes em cada uma das raças, desenvolvendo as várias qualidades que elas proporcionam. A reencarnação, idéia antiga das filosofias orientais, é hoje adotada por mais de metade da população do mundo. (No Ocidente, até membros da comunidade científica estão começando a interessar-se por ela. Recentemente, o dr. Ian Stevenson documentou casos que só parecem explicáveis através do conceito da reencarnação.)(8) Sustenta a filosofia ocultista que o sentido essencial de uma existência é assimilado pela alma e nela se incorpora entre as encarnações.

As tradições orientais ensinam que efeitos dos acontecimentos e das ações de

uma vida podem ser transferidos para outras vidas. Assevera o Ocultismo que o universo é uma teia inseparável de interconexões dinâmicas. Corroboram essa maneira de ver a física moderna e os estudos de ecologia. De acordo com o Budismo e o Hínduísmo, o equilíbrio dinâmico da vida é mantido pela lei do carma, que significa ação. Capra define o carma como:

“... o princípio ativo do jogo, o universo total em ação, onde tudo está dinamicamente ligado a tudo o mais. Segundo o Gita, "o Carma é a força da criação, da qual todas as coisas recebem sua vida", (9)

O equilíbrio produzido pelo carma resulta em ordem e legitimidade que se estendem ao reino moral e à atividade humana. A expressão bíblica, "Como semeardes, assim colhereis", capta a essência dessa lei em ação. O resultado de nossos atos torna-se manifesto, não somente nos eventos e circunstâncias de nossas vidas, mas também no nosso caráter. Falando sobre os ensinamentos do Vedanta, diz Zimmer:

“... o fruto portador do carma são os incidentes e elementos da nossa atual biografia, bem como os traços e disposições da personalidade que os produz e suporta.” (10)

O Lama Govinda comenta o mecanismo que aqui funciona:

“o caráter nada mais é que a tendência da nossa vontade, formada por ações repetidas. Cada ato deixa um traço, um caminho feito pelo processo de caminhar, e onde quer que exista um caminho assim palmilhado, ali constatamos, quando se apresenta uma situação semelhante, que tomamos esse caminho espontaneamente. Essa é a lei da ação e da reação, a que damos o nome de carma, a lei do movimento na direção da menor resistência ... É o que comumente conhecemos como "força do hábito". Quando saímos de uma e entramos em outra vida, a consciência assim formada constitui o núcleo ou germe da nova personificação.” (11)

Na terminologia de Leadbeater, esse núcleo consiste em "átomos permanentes", que passam de uma encarnação a outra. Um átomo de matéria de cada um dos planos inferiores liga-se à mônada para servir de repositório de experiência naquele plano, através de todas as séries da encarnação do indivíduo. A noção budista dos skandhas é semelhante a essa idéia.

Vê-se, dessa forma, que o próprio homem é o autor do seu destino, parte do qual escreveu num passado distante. Mas o resultado das suas ações são menos recompensas e punições do que experiências educativas para o seu crescimento. Além disso, o carna não supõe uma predestinação fixa. Novas atitudes e maneiras de responder a circunstâncias servem de novas causas capazes de alterar (mas não obliterar) o resultado de ações anteriores. À proporção que o homem assume maior controle de si mesmo, exerce maior influência consciente sobre o curso de sua vida.

Todas as religiões ensinam um modo de acelerar o desenvolvimento espiritual.

Práticas espirituais, como a ioga, a meditação, a oração, os mantras, destinam-se a despertar poderes latentes. Neste livro, Leadbeater refere-se a muitos aspectos da vida interior associados ao crescimento espiritual. As palestras nele enfeixadas eram dirigidas a estudantes no caminho do desenvolvimento espiritual que buscavam desenvolver-se a fim de poder prestar maiores serviços.

Leadbeater alude freqüentemente a adeptos, Mestres e outros seres altamente evoluídos.

A existência de tais seres é uma conseqüência natural da lei da evolução da vida consciente. No Oriente, a existência de pessoas espiritualmente maduras é tida como líquida e certa; nessa suposição se baseia a tradição guru-discípulo. O Ocidente também reconheceu iniciados e adeptos, sobretudo no antigo Egito e no tempo das escolas gregas de mistério. Não só o Ocultismo mas também a filosofia oriental amontoaram umas sobre as outras categorias de seres evoluídos numa hierarquia sem fim.

Alguns são conhecidos como grandes homens da História, ao passo que a maioria trabalha em silêncio e no isolamento. Vários tipos de seres avançados são mencionados como adeptos, chohans, Dhyan Chohans, devas e assim por diante. Embora sejam seres individuais distintos, todos inerem a uma vida universal divina, e são só seus centros. Leadbeater enfatiza, em particular, um ser que está muito além do nível da humanidade, a quem chama de Logos Solar. No seu entender, a vida dos seres divinos penetra, sustenta e dirige todo o sistema solar.

O Sr. Leadbeater, homem da maior integridade, usava a sua visão com tanta objetividade e cuidado quanto possível. A maior parte das suas investigações foram corroboradas por outros clarividentes que trabalhavam com ele. Sem embargo disso, algumas colorações culturais e modelos vitorianos de pensamento do seu tempo insinuaram-se necessariamente nas suas interpretações. Mas quaisquer distorções ligeiras ou expressões obsoletas são mais que superadas pela grandeza da sua visão e pelas suas fascinantes observações sobre os reinos ocultos da natureza.

Shirley Nicholson

6 de novembro de 1977

Notas e Referências:

1. C. W. Leadbeater, Man Visible and Invisible. Adyar, Madrasta, índia: The Thoosoprucal Publishing House, 1942, p. 26. [O Homem Visível e Invisível, Editora Pensamento, São Paulo, 1988.]

2. Fritjof Capra, The Thao of Physics. Boulder: Shambhala Publications, Inc., 1975, p. 210. [O Tao da Física, Editora Cultrix, São Paulo, 1988.]

3. C. W. Leadbeater, The lnner Life, VoLlI. Wheaton: The Theosophical Press, 1942, p. 179.

4. Lama Anagarika Govinda, Foundations ofTibetan Mysticism. Nova York: Samuel Weiser, 1947, p. 148. [Fundamentos do Misticismo Tibetano, Editora Pensamento, São Paulo.]

5. Arthur W. Osborn, The Expansion of Awareness, Adyar, Madrasta, índia: The Thoosophical Publishing House, 1961, p. 65.

6. Raynor C. Johnson, The Imprisoned Spíendour, Wheaton: The Theosoprucal Publishing House, 1971, 1977, p. 262.

7. Arthur Koestler, Nature, 1965, pp. 208, 1.033.

8. Ian Stevenson, M.D., Twenty Cases Suggestive of Reincarnation, Charlottesville: University Press of Virginia, Rev. 211 edição.

9. Capra, op. cit., p. 156.

10. Heinrich Zinuner, Philosophies of India. Nova York: Meridian Books, 1956, p. 442.

11. Govinda, op. cit., p. 243.


FONTE: “A Vida Interior”, de C. W. Leadbeater, publicado no Brasil pela Editora Pensamento, em 1996.

sábado, 1 de agosto de 2009

Palestra Pública Gratuita de Teosofia em Florianópolis

Tema: Os Veículos de Manifestação da Consciência

Palestrante: Adolfo Kuhn Pfeifer, engenheiro, mestre em ergonomia, com formação em orientação profissional, é membro da Sociedade Teosófica desde 1999 e atual coordenador do GET Florianópolis. É vegetariano desde 2001.

Data: 04/08/2009 (3a. feira)

Horário: das 20:00h às 22:00h

Local: Atman Amara (www.atmanamara.com.br) - Rua José Francisco Dias Areias, 390 - Bairro Trindade - Fones (48) 3333 2311 - 99616709

Organização: Grupo de Estudos Teosóficos de Florianópolis – GET Florianópolis, vinculado à Sociedade Teosófica no Brasil.

Informações: (48) 9960 0637 (get.florianopolis@sociedadeteosofica.org.br )

Observações: Os participantes da palestra são convidados para uma segunda reunião de aprofundamento do tema.